sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010


O Casamento ou o Grito do Ipiranga...Capítulo IV









A segunda metade da década de 70 estava a ser particularmente difícil para os moradores da Rua Nova Stella, 6.
O casal Yolanda e Joaquim, que criaram a sua família e educaram os seus cinco filhos com um forte sentido gregário, ambicionavam envelhecer rodeados de filhos e netos.
Mas alguns acontecimentos começaram a interpor-se nesse objectivo de vida, em parte como decorrência das transformações na sociedade portuguesa pós-25 de Abril, noutra parte pela natural vontade de afirmação e independência que os filhos manifestam em relação ao poder parental.
A primeira foi a primogénita Landinha, irmã com a qual não tive muito contacto nessa época, fruto da diferença de idade, da sua maneira de ser algo introvertida e também daquela atitude que alguns familiares apelidavam de "nariz empinado". Viajou para Inglaterra, para concluir os estudos académicos, vindo a começar namoro com um jovem escocês ruivo, igualmente de firme carácter. Estes laços pessoais e culturais que foi criando, cedo indiciaram que o percurso da sua vida seria realizado fora do seu país, nomeadamente quando anunciou o seu casamento com o Tom.
O segundo foi o João Carlos, que após os arremedos políticos juvenis, que o levaram pelos caminhos da esquerda radical, e não tendo uma ligação amorosa que o "amarrasse" em Portugal, entre as muitas que seu estilo pinga-amor sempre cultivou, decidiu-se iniciar uma carreira profissional na sua área de formação, a engenharia, actuando como cooperante na hidroeléctrica de Cabora Bassa em Moçambique.
Eis que, após concluir a sua licenciatura em Biologia, a "dócil" Luísa comunica aos pais que vai casar e mudar-se para o Brasil para seguir o seu coração!
Foi um rude golpe para quem via desmoronar a sempre presente ideia de uma família fisicamente próxima.
Acredito que as pressões que a Luísa sofreu para desistir desta ideia tenham sido mais que muitas, quer tenham origem na família, em amigos ou pretensos "proto-namorados" que viram na minha ausência um hipotético caminho livre para ganhar o afecto da Luísa. E posso até acreditar com o recurso, à falta de outros, a argumentos baixos do estilo: "Olha que ele por estas horas já se encantou com alguma brasuca..."!
Mas a Luísa sempre seguiu o que o seu coração dita...
No meio deste "conflito", em abono da verdade eu tinha alguns aliados, não tão influentes pela sua juventude, mas ainda assim sempre estiveram do meu lado.
Falo do Quim, que apesar de ter sido nomeado pelo Sr. Almirante como "cão de guarda" (sem ofensa!) da sua Luisinha, durante os nossos acalorados encontros, sempre descobriu uma forma equilibrada de, sem deixar de cumprir a sua missão perante o pai, dar aos pombinhos terreno livre para darem azo ao seu eflúvio hormonal...
E falo da Lena, a irmã mais nova e minha apoiante desde a primeira hora. A Lena, no linguajar da época, um verdadeiro "borrachinho" que os marmanjos do continente, por pura inépcia, deixaram escapar para os Açores, para onde se deslocou por motivos também académicos e onde veio a ser "caçada" por um simpático e atento ilhéu, o Zé Lúcio.
Para quem siga ou acredite no zodíaco, a Balança Luísa é entre outras características, harmonizadora, agradável para todos que se encontram com ela, indecisa, com uma atracção própria sem igual, criativa, enérgica e muito social, que odeia estar só, calma e generosa, muito amorosa, bonita e namoradeira.
Mas eu me permito acrescentar pelo menos mais uma: Determinada!
E foi esta determinação que a fez vencer, para além da barreira do tempo e da distância, a barreira familiar no seu objectivo de se juntar ao seu amor.
Sem ajudas externas ela preparou toda a logística e organização daquilo que foi uma mudança radical, uma verdadeira revolução, na sua vida! Teve, no entanto, de condescender aos pais numa coisa: Não viajaria para o Brasil sem ser casada.
Aqui entrou a criatividade lusa: Como o noivo não podia dispor da quantia necessária para pagar a viagem e um depósito compulsório (imposto não reembolsável) para quem viajava para o estrangeiro, optaram pelo casamento por procuração! Situação que mais tarde tivemos dificuldade em explicar aos filhos que não viam nas fotos do casamento o seu pai, mas o seu tio Quim...
Como facilmente podem compreender, para que não ocorressem percalços nem "apropriações indébitas", sabiamente optei por passar a procuração a um irmão da Luísa!
As fotos que ilustram o casamento são, para dizer o mínimo, paradoxais!
Se por um lado são sintomáticas da habitual e esfusiante alegria da Luísa, dos padrinhos Leonor e Fernando e de alguns amigos, são também sintomáticas do que na altura me pareceu uma "fúria contida", para com um genro mão-de-vaca que nem ao casamento comparece e que ainda por cima leva a nossa querida Luísa para os confins do mundo.
O futuro veio a comprovar que a minha percepção estava errada!
A História segue dentro de momentos...

2 comentários:

  1. Lindo papi, prende mais que os livros do dan brown! vou ver se imprimo para as avós lerem :)

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  2. Adorei rever o que nesse dia se passou,e que não mais esqueci! Ri e chorei ao ler as tuas linhas e a forma como descreves o evento. Posso acrescentar, e espero que a D. Iolanda me perdoe, que a Luísa estava realmente determinada, pois no momento em que a cerimónia começou, e era suposto a Luísa dar o seu SIM, a D. Iolanda não conseguiu conter a sua emoção e retirou-se da sala, logo seguida do Snr. Comodoro que a queria trazer de volta à cerimónia ,e nesse momento a Luísa impávida e serena virou-se para a notária e disse,prossiga se faz favor!.

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